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Secretarias do
Centro Administrativo
da Bahia

José Fernando Minho

No início da década de 1970, Lelé foi convidado pelo governo do Estado da Bahia para projetar cinco prédios para as secretarias da administração estadual, a serem instaladas no Centro Administrativo da Bahia. Após a experiência de Brasília, Lelé se tornou conhecido pela capacidade técnica e pelo enfrentamento dos desafios com as ferramentas que as tecnologias contemporâneas disponibilizam. Nos textos a seguir, extraídos do livro João Filgueiras Lima, Lelé, ele vai discorrer sobre as principais soluções que adotaria para a execução dessas edificações. 

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Secretarias do Centro Administrativo da Bahia

José Fernando Minho

Valores para preservação da Igreja da Ascensão do Senhor

Entre os projetos realizados por João Filgueiras Lima – o Lelé, ressalta-se a Igreja da Ascensão do Senhor, marco da arquitetura moderna tardia no Brasil. A Igreja possui valores que tornaram possível seu tombamento pelo município de Salvador (FGM-PMS), realizado em dezembro de 2020. O tombamento é um primeiro impulso para a preservação da Igreja, que deve ser seguido por outros que estimulem a sua conservação e seu pleno usufruto pela comunidade. Foi construída em 1975 como parte do conjunto das arquiteturas do Centro Administrativo da Bahia (CAB). Esse é um complexo político-administrativo que se configura enquanto um conjunto urbano que possui algumas obras de caráter mais monumental – como é o caso da Igreja.

Há que se destacar alguns dos seus valores. No que tange aqueles de caráter técnico, salienta-se a destreza do arquiteto para lidar com duas técnicas contrastantes, a da pedra e a do concreto. Essas técnicas são usadas para conformar a volumetria tripartida da Igreja, composta pela nave, Capela do Santíssimo e recinto dos padres. A primeira possui uma inusitada estrutura geométrica composta por pilares e pétalas de concreto armado dispostos de forma ascendente; as últimas possuem uma singular estrutura mais terrena e orgânica, com fechamentos em pedras argamassadas. 

O valor técnico se associa com o estético através da expressividade plástica alcançada pela estrutura. Entretanto, seus valores estéticos não se limitam a isso, articulando-se a dimensões materiais e imateriais. Assim, nota-se a espacialidade criada pelo conjunto das doze pétalas que conforma a nave utilizada para missas, que possui um caráter amplo, ascensional e fresco; também chama atenção a Capela do Santíssimo, que fora outrora um recinto dedicado ao batismo e ao ritual fúnebre, concebida de modo diminuto, entranhado ao solo, úmido. Ressalta-se também as entradas de luz nos ambientes conformando atmosferas distintas que contemplam o sentido espiritual do templo. Essas características permitem a criação de uma obra arquitetônica brutalista baiana e brasileira de traços peculiares e caráter icônico. 

Quanto aos valores históricos e sociais, indica-se o momento histórico associado à constituição da Igreja, correspondente com a Ditadura Militar (1964-1985). Essa é uma obra marcada por uma radicalização da modernidade, inserida dentro de um imponente Centro Administrativo, que é uma importante tipologia urbana viabilizada pelo projeto desenvolvimentista. É um exemplo modelar do processo de expansão das cidades brasileiras, que produziu radicais rupturas das relações espaciais tradicionais, contribuindo para a constituição de cidades segregadoras, como é o caso de Salvador. É necessário salientar que, estando situada em um local distante, a Igreja se tornou pouco a pouco importante para os fiéis do seu entorno. Os espaços do CAB, principalmente suas áreas verdes, também são usados para outras manifestações religiosas além do catolicismo, como no caso daquelas de matriz africana. 

Finalmente, indicam-se os valores paisagísticos. A Igreja é participante íntima e harmônica da natureza. Possui uma concepção dupla: seus recintos superiores são mais geométricos, etéreos; seus recintos inferiores são mais orgânicos, terrenos. É circundada imediatamente por plantas e arbustos pelo paisagismo do CAB, com características modernas. Essa estrutura paisagística que envolve a Igreja reforça a transitoriedade entre dois mundos (sagrado e profano), que se conformam como partes indissociadas de uma harmonia cósmica.

Ao apontar todos esses valores da Igreja, considera-se que é meritória não apenas do seu tombamento realizado pelo município de Salvador, mas que também tem potencial para ser tombada estadualmente e federalmente.

Ana Carolina Bierrenbach 

& Marcela Porto

Centro de Exposições
Balança

Escolas da
RENURB

Michel do Vale

Documentos da época da Prefeitura de Salvador mostram que as propostas dos terminais de bairro compreendiam, sempre que possível, a implantação de espaços públicos, áreas de lazer e edifícios institucionais, como escolas, creches e postos de saúde. Ainda que o financiamento de diversas dessas obras não tenha sido viabilizado a tempo pela administração municipal, uma série desses equipamentos foram previstos, enunciados ou mesmo projetados, junto com as propostas de acessibilidade e saneamento.

Esses equipamentos comunitários não contavam com uma linha completa de elementos pré-fabricados para sua composição. O que foi projetado e parcialmente executado combinava algumas peças pré-moldadas em concreto com outros elementos existentes no mercado, estruturas moldadas in loco e tijolos cerâmicos.

E ainda que não estivessem associadas a um conjunto de obras de infraestrutura, as escolas e demais equipamentos propostos buscavam ao menos a urbanização do seu entorno imediato, incluindo aí calçada, canalização de córrego, escadaria, pavimentação de vias, tratamento de encostas etc.

Entre as escolas projetadas, destacam-se a da Baixa do Tubo (executada), Capelinha de São Caetano, Plataforma (não executadas) e o centro de equipamentos comunitários do Vale das Pedrinhas (parcialmente executado). Esses edifícios eram caracterizados pela combinação de concreto e tijolo cerâmico aparente, brises, sheds, blocos de circulação independente do corpo principal da construção e a integração de áreas ajardinadas ao espaço construído.

Escolas da RENURB

Sobre o uso de pré-fabricados
de argamassa armada no saneamento básico

“No plano físico das favelas, a precariedade e

a singularidade na organização dos assentamentos e a peculiaridade

geográfica e topográfica de cada local inviabilizam

a priori a aplicação de métodos tradicionais de drenagem

e saneamento básico quer pelos altos custos econômicos,

quer pelos problemas sociais gerados pelo próprio

trânsito de equipamentos pesados que determina a remoção

de grande número de habitações.”


 

LIMA, João Filgueiras

Escola transitória. Brasília, MEC/CEDATE, 1984

Obras de drenagem: canalizações e escadarias drenantes
A Bacia do Camurujipe

Michel do Vale

Em 1980, a Prefeitura passou a priorizar a fixação da população de baixa renda nas áreas já ocupadas, através da legalização da posse da terra e da implantação de infraestrutura, utilizando, para tanto, os trabalhos da Renurb, que consistiam em projetos de macrodrenagem e microdrenagem, contenção de encostas e taludes, entre outros. 

A tecnologia desenvolvida era composta por um sistema de peças pré-fabricadas para utilização na drenagem e na contenção de encostas e pesavam até 100 kg, o que permitia uma grande simplicidade no transporte e na execução, além do aproveitamento de operários não especializados residentes no local – “multiplicando a produtividade na instalação e promovendo a integração pelo trabalho entre comunidade e Prefeitura”. [1]

Um conjunto de obras importantes nesse programa foi o de escadarias drenantes, iniciado no Nordeste de Amaralina. Tais escadarias serviam tanto de acesso às moradias e ocupações nas encostas quanto para escoar, nas canaletas em seu bojo, sob os degraus, águas pluviais e o esgotamento sanitário das casas, através de conexões com as fossas residenciais. [2] Essa infraestrutura possuía assim três funções: acessibilidade, drenagem e contenção.

A gestão já havia testado o sistema no Nordeste de Amaralina e no Vale das Pedrinhas e estava desenvolvendo o projeto para cerca de sessenta assentamentos na área de influência da Bacia do Camurujipe. A expectativa era de expandir esses projetos para grande parte dos assentamentos de baixa renda insalubres de Salvador:

“A RENURB, nas pesquisas que desenvolveu sobre o material a partir de 1979, levou sempre em conta, para chegar aos pré-moldados, a topografia e as condições naturais do terreno de Salvador, bastante acidentadas.”3

O saneamento básico era contemplado com a macro e microdrenagem de bacias de fundo de vale através da canalização de córregos; a drenagem das encostas com as escadarias drenantes; e a contenção de taludes com peças de contenção escalonadas. O prefeito destaca, para isso, o papel fundamental da RENURB:

“Tanto o Escritório de Projetos quanto a Usina de Pré-moldados têm uma participação fundamental nessas intervenções. Ambos, na verdade, utilizando recursos tecnológicos sofisticados, criaram uma tecnologia extremamente simplificada e apropriada às características topográficas da Cidade (o diálogo cumeada versus fundo de vale) e às particularidades das favelas baianas (assentadas nas encostas, a partir das cumeadas, ou no fundo das bacias sobre os afluentes).”4

1. SALVADOR. Saneamento Básico. Salvador [1981?] (folheto).

2. Cf. MANGIERI, Lúcio Sérgio Garcia. Avaliação dos sistemas de escadarias e rampas drenantes implantadas em assentamentos espontâneos na cidade do Salvador-Bahia. Salvador: EP UFBA, 2012 (dissertação de mestrado), pp. 8-10. 

3. idem

4. Cf. SALVADOR (cidade). Prefeito 1979-1981. Mensagem enviada à Câmara Municipal pelo Prefeito Mário Kertész – Março/81. Salvador: PMS, 1981, p. XXV

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